O prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos), vetou totalmente o projeto de lei aprovado pela Câmara no último dia 2 de maio, que passou o salário dos vereadores de R$ 8,9 mil para R$ 17,6 mil, a partir de 2025.
Protocolado na segunda-feira (29), o veto total caiu como uma bomba no plenário e, na definição de um vereador, “espalhou a base do prefeito”.
Correligionário de Pazolini, o presidente da Câmara, Leandro Piquet (Republicanos), puxa a fila dos indignados com o veto e suas razões.
Repercussão
A repercussão muito negativa entre os vereadores da base levou a Prefeitura de Vitória a executar uma operação de emergência com o objetivo de apagar o incêndio político, mas a tentativa não foi tão bem-sucedida.
No fim da manhã de terça-feira (30), o secretário de Governo, Aridelmo Teixeira (Novo), foi pessoalmente ao plenário para conversar com os vereadores e tentar aplacar os ânimos, acompanhado do advogado Tarek Moussallem, chefe da Procuradoria-Geral do município, autor do parecer jurídico que fundamentou a decisão de Pazolini, opinando pela inconstitucionalidade do projeto de lei.
Suspensão da sessão
A reunião ocorreu em plenário logo após a sessão ordinária, suspensa por Piquet justamente para evitar que os colegas externassem em plenário sua insatisfação exacerbada com o prefeito e sua equipe – ou seja, para evitar um desgaste ainda maior entre as partes.
Segundo Aridelmo, no diálogo com os parlamentares, ele procurou explicar detidamente as justificativas técnicas do veto. Além disso, enfatizou que a base está liberada para se posicionar sobre o veto e que o plenário tem total autonomia para manter ou derrubar a decisão do prefeito. Portanto, a base de Pazolini está liberada para rejeitar o veto, se assim entender.
Entretanto, a tentativa de apagar o fogo pode ter jogado, involuntariamente, ainda mais gasolina no incêndio. A reunião transcorreu em clima muito pesado, principalmente entre Aridelmo e Piquet (Republicanos).
No momento mais tenso, os dois trocaram palavras ásperas. Segundo relatos, Aridelmo sugeriu que Piquet estaria faltando com a verdade a respeito de um dos maiores pontos de discórdia: quando exatamente o presidente da Câmara foi comunicado pelo secretário de governo da decisão do prefeito de vetar o reajuste salarial?
Diante da versão mantida por Piquet, o secretário afirmou: “Então um de nós dois está mentindo…”. Nesse momento, Piquet retirou-se do plenário e da reunião, que prosseguiu sem o presidente.
O veto do prefeito foi protocolado no sistema da Câmara na segunda-feira (29), precisamente às 17h28. Piquet sustenta que só foi informado à noite, depois que o veto já tinha sido protocolado. Aridelmo alega o contrário.
Os dois chegaram a se reunir na Prefeitura de Vitória na tarde de segunda-feira, em busca de saídas jurídicas e políticas para o impasse, mas sem terem chegado a um consenso.
Segundo Piquet, para sua surpresa, o veto foi protocolado de qualquer maneira, sem conhecimento prévio e a concordância de sua parte. Na versão do presidente, ele foi informado sobre a protocolização do veto por um vereador, na noite de ontem, em um telefonema.
Após a reunião no plenário com Aridelmo, Piquet recebeu cinco vereadores em seu gabinete, na presidência da Câmara: Anderson Gogi (PP), Dalto Neves (PDT), Luiz Paulo Amorim (SD), Maurício Leite (Cidadania) e Aloísio Varejão (PSB). Os três últimos são os autores do projeto de lei.
O presidente se mantém contrário ao mérito do projeto – é contra a ideia do reajuste para os vereadores –, mas está indignado com a maneira e o momento em que o veto foi aposto.
Discordâncias técnicas
O veto de Pazolini é embasado em parecer da Procuradoria, que aponta problemas de ordem formal e material no projeto de lei aprovado pelos vereadores em 2 de maio, por 8 votos a 5.
Um dos principais argumentos é o de que, basicamente, a Câmara não poderia ter fixado o salário dos vereadores na próxima legislatura por meio de projeto de lei municipal, mas deveria tê-lo feito por projeto de resolução.
Com efeito, se a Câmara escolheu estabelecer por meio de lei o subsídio dos Vereadores, ao invés de uma resolução, decorre daí inafastável inconstitucionalidade formal.
Projetos de resolução são aqueles que tratam de questões internas, administrativas e organizacionais da própria Câmara. Se aprovados em plenário, são diretamente promulgados pela Mesa Diretora, não passando pela análise do chefe do Executivo. Portanto, independem de sanção ou veto do prefeito.
A Câmara de Vitória o fez por meio de projeto de lei – como, diga-se de passagem, também têm feito outras Câmaras Municipais que têm aprovado projetos de reajuste para seus vereadores, equiparáveis ao de Vitória.
A outra a falha apontada pelo procurador-geral é que, contando o pagamento de um 13º salário aos vereadores – instituído pelo mesmo projeto –, a remuneração total anual dos parlamentares passará a superar a do prefeito a partir de 2025, “implicando verdadeiro vício material”. O prefeito de Vitória recebe R$ 18.478,00 por mês, mas não tem direito a 13º.
Batata quente
De todo modo, ao aprovar esse projeto de lei, a Câmara de Vitória jogou no colo de Pazolini uma bomba política com a qual ele “não tinha nada a ver”.
A iniciativa foi toda dos vereadores, mas, como se tratava de projeto de lei, cabia ao prefeito se posicionar sobre o mais que robusto aumento salarial dos parlamentares. Não tinha como fugir.
E esse era o tipo de situação em que, politicamente, o prefeito não tinha como ganhar.
A matéria era onerosa na dupla acepção do termo: além do ônus financeiro que o aumento gera aos cofres públicos a partir de 2025, há o ônus político inevitável do desgaste perante a opinião pública.
Como já analisado aqui, a partir do momento em que o projeto chegou para Pazolini, no dia 5 de maio, ele tinha três decisões possíveis, e nenhuma delas era boa. Todas trariam algum ônus para ele.
Em primeiro lugar, ele poderia simplesmente ter sancionado o projeto. Nesse caso, porém, teria de assumir o desgaste junto à opinião pública, que poderia acusá-lo de “cumplicidade com gastança” – logo ele, que tem buscado cultivar a imagem de um gestor comprometido com a austeridade fiscal.
Alternativamente, ele poderia ter deixado se esgotar o prazo legal de 15 dias úteis que tinha para vetar ou sancionar o projeto, desde o recebimento formal – o que, na prática, é considerado “sanção tácita”. Se tivesse feito isso, ele não teria exatamente “sujado os dedos” com a tinta da sua assinatura na sanção formal ao projeto. O presidente da Câmara, Piquet, é quem teria promulgado e publicado a nova lei municipal. Mas, embora o desgaste fosse bem menor, o prefeito poderia levar a pecha da omissão e da “vista grossa”.
Por fim, a terceira saída foi precisamente a escolhida pelo prefeito: vetar o projeto de lei. Nesse caso, ainda que as razões do veto sejam de ordem técnica e não econômicas, Pazolini reforça a sua imagem associada à austeridade fiscal, ao rigor com relação ao gasto público.
Mas o prejuízo inevitável é de outra ordem: o desgaste no relacionamento político com o Legislativo, sua base incluída, de quem o prefeito depende para ver aprovados os projetos de sua administração.
Em outras palavras, a repercussão para fora, para a sociedade em geral, pode ser positiva; para dentro da Câmara, é péssima.
Fato é que, após ter recebido da Câmara uma verdadeira bomba política, Pazolini acabou devolvendo para os vereadores uma outra ainda maior.
Foi tipo isso: o prefeito recebeu a bomba, matou-a no peito e devolveu-a maximizada para o prédio ao lado, sede do Legislativo Municipal.
Agora, caberá ao presidente Piquet pautar o veto do prefeito e, ao plenário, apreciá-lo. Se quiserem manter o aumento para o próximo mandato, rejeitando o veto do prefeito, os vereadores poderão fazê-lo, por maioria absoluta – pelo menos oito dos 15 parlamentares.
Para isso, porém, serão obrigados a enfrentar um desgaste político duplicado: o primeiro, já atravessado, ao aprovarem o projeto de lei no início de maio; o segundo, ao rejeitarem o veto do prefeito (que nada mais é que uma forma de aprovar o mesmo aumento duas vezes).
Riscos políticos para Pazolini
Cumpre observar que, da parte de Pazolini, esse movimento é bastante arriscado.
Além de zelar por sua imagem como gestor público, é preciso cultivar um bom relacionamento com a Câmara. Dependendo dos humores e da disposição dos vereadores em relação à Prefeitura, esta pode encontrar ou facilidades ou muitas dificuldades na tramitação de seus projetos. Nesta segunda metade do mandato, essa relação costuma ficar ainda mais delicada; o plenário, ainda mais nervoso.
Como já registrado aqui, em meados de março, a relação do prefeito com a Casa estava longe do seu melhor momento. Vereadores de oposição começaram a dar mais trabalho, enquanto a base do prefeito começou a emitir, em maior ou menor grau, sinais públicos de dispersão.
Desde então, esse relacionamento vinha melhorando sensivelmente. Mas, de repente, vem essa bomba, que no limite pode implodir a base, mas cujo real impacto só os próximos dias dirão.