Pesquisas realizadas pela Fiocruz, em colaboração com as organizações não governamentais ACT Promoção da Saúde e Vital Strategies, estimam o impacto financeiro que o consumo de alimentos ultraprocessados e de bebidas alcoólicas exerce sobre o Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil. Os dados obtidos a partir de atendimentos no SUS revelam que os gastos diretos associados à má alimentação, principalmente com ultraprocessados, somam R$ 933,5 milhões anuais. Quando custos indiretos e mortes prematuras são contabilizados, este total chega a R$ 10,4 bilhões. Por outro lado, os custos gerados pelo consumo de bebidas alcoólicas alcançam R$ 18,8 bilhões ao ano. Esses números não abrangem atendimentos realizados na rede suplementar de saúde, como planos de saúde e clínicas particulares, nem casos em que a má alimentação ou o uso de álcool não são as principais causas das doenças tratadas.
Os estudos sugerem a implementação de uma combinação de estratégias para mitigar esses impactos. Entre as propostas está a introdução de impostos seletivos, que aumentariam o custo de produtos prejudiciais à saúde pública. Essas taxas poderiam atuar de maneira semelhante às campanhas de combate ao tabagismo. Segundo Marília Albiero, coordenadora de Inovação e Estratégia da ACT Promoção da Saúde, “esses impostos não apenas poderiam financiar o tratamento das doenças causadas por esses produtos, como também reduzir o consumo de substâncias nocivas, incentivando escolhas alimentares mais saudáveis”. Além disso, a efetivação dessas medidas poderia resultar em uma diminuição dos custos do sistema de saúde ao longo prazo, impactando positivamente a produtividade e a expectativa de vida da população.
As organizações envolvidas promovem uma campanha focada na inclusão de impostos sobre ultraprocessados e bebidas alcoólicas na reforma tributária, visando conciliar promoção da saúde com políticas de justiça tributária. Pedro de Paula, diretor da Vital Strategies no Brasil, ressalta a importância de um sistema tributário que considere setores que geram maiores custos associados à saúde pública. “É necessário que esses setores contribuam para cobrir os custos que impõem à sociedade, criando uma dinâmica que favorece tanto a arrecadação quanto a implementação de políticas de saúde necessárias”, comentou.
Os estudos também detalham que as doenças associadas ao consumo de ultraprocessados e álcool causam, respectivamente, 57 mil e 105 mil mortes ao ano. Embora o aumento da taxação não seja uma solução definitiva para o problema do consumo excessivo, estima-se que poderia reduzir essas mortes em aproximadamente 25%, salvando cerca de 40 mil vidas anualmente e aprimorando a qualidade de vida. Em comparação, as campanhas anuais para controle de doenças transmissíveis, como a dengue, têm o potencial de salvar cerca de duas mil vidas por ano. Tal comparação destaca a significância da intervenção proposta.
Sobre o álcool, a campanha “Quer uma dose de realidade?” foi desenvolvida para compreender a percepção pública acerca da taxação. Uma pesquisa realizada com cerca de mil brasileiros revelou que 62% apoiam o aumento de preços de bebidas alcoólicas, e 61% são favoráveis à imposição de impostos para reduzir o consumo. Para 77% dos entrevistados, o governo deve ser responsável por mitigar os danos associados ao uso do álcool. A preocupação com as 105 mil mortes relacionadas ao álcool, e suas repercussões sociais e de saúde mental, foram enfatizadas como tópicos relevantes durante as discussões sobre tributação.
A pesquisa também aponta a possibilidade de redução de riscos associados a problemas sociais amplamente disseminados, como o impacto do consumo de álcool em violência doméstica e acidentes de trânsito. Esses elementos revelam a necessidade de uma abordagem abrangente para lidar com os efeitos nocivos do consumo de ultraprocessados e bebidas alcoólicas na sociedade brasileira.